O PROJETO GRANBERY DE UNIVERSIDADE METODISTA: "O SONHO QUE SE TORNOU PESADELO"

Prof.Dr.Elias Boaventura

1. Introdução

Os Missionários Metodistas, que vieram ao Brasil no fim do século XIX e aqui se encontravam por ocasião da Proclamação da República e nela influenciaram tanto quanto lhes foi possível, exerceram relevante papel junto ao Sistema Educacional Brasileiro, naquele momento completamente desarticulado e com problemas graves de funcionamento, principalmente logo após a Proclamação da República o que levou Primitivo a afirmar:

"De fato o ensino desceu até onde podia descer: não se fazia mais questão de aprender ou de ensinar... estabelecendo-se as duas fórmulas: bacharel quanto antes; dinheiro quanto mais".

A desarticulação do sistema se deu em função das mudanças na esfera do poder, das novas diretrizes da política econômica e do radicalismo da reforma Benjamim Constant, criticada pelos próprios positivistas e pela resistência que a ela fizeram a Igreja Cristã, a Igreja Positivista, o Estado e as classes dirigentes, à época pouco desejosas de ver transformações substanciais em relação à prática e aos fins da educação até então ministrada.

Este "caos" constituía porta aberta aos missionários, que desde os últimos anos do II Império aqui se encontravam e mantinham-se atentos aos espaços, que se lhes abria, com a aquiescência prudente do Segundo Império e mais ostensivamente na República. Salvador se refere a esse momento com muito otimismo:

"Contudo, o espírito que ora norteia o Departamento de Educação Pública promete grandes mudanças. ao Protestantismo estão abertas, agora, as portas do ministério educativo..."

De fato, a linguagem das autoridades brasileiras se caracterizava pela maneira generosa como se referia aos norte-americanos.O ministro Tavares afirmava:

"O Brasil carece de sangue novo... carece de espírito Yankee, desse arrojo, dessa energia, desse másculo espírito de invenção e progresso..."

No mesmo texto o Ministro, se deixa tomar de alguma lucidez e não hesita em afirmar antes de encerrar sua fala:

"Ia-me esquecendo lembrar o mais eficaz dos argumentos e dos interesses comerciais . O comércio entre os dois países cresce a olhos vistos."

Parece-nos que o dado que o Ministro ia se esquecendo de colocar, como ele mesmo reconhece, é o que preside o êxito das escolas protestantes naquele momento no Brasil. A Escola, enquanto aparelho do Estado é sensível a suas chamadas e, por ser uma agência pedagógica privilegiada em todos os graus do ensino, procura responder às necessidades mais imediatas da sociedade civil para o desempenho desta função. Maria Luiza Ribeiro afirma em relação ao momento que estamos analisando:

"No momento em que os interesses comerciais americanos localizaram-se nos principais centros comerciais e urbanos brasileiros, comunidades estadunidenses; no Rio, São Paulo, Porto Alegre, o aparecimento de escolas para os filhos de norte-americanos era desejado em meio tão carente de instituições de ensino"

Neste quadro de ausências de escolas, da existência de um ensino com péssima qualidade, em função da múltiplas reformas que não atingiam os problemas fundamentais, principalmente pelos efeitos da reforma Rivadária, os Metodistas tinham diante de si enorme espaço que procuraram ocupar do melhor modo possível ao alcance deles.

Dedicaram-se com empenho aos graus menores do ensino e também se lançaram na ministração do ensino superior, este, até Rivadária, inexpressivo sob controle governamental e esvaziado em sua utilidade em função da postura positivista:

"A República não admite também privilégios filosóficos,científicos, artísticos, clínicos ou técnicos, sendo livre no Brasil o exercício de todas as profissões, independente de qualquer título escolástico, acadêmico ou outro seja de que natureza for. Diziam eles que os diplomas escolares não atestam o mérito dos profissionais..."

Em função deste quadro, entendiam os missionários metodistas que, embora não considerassem a educação formal o melhor caminho para uma ação evangelística e doutrinária o espaço aberto deveria ser ocupado para a preparação de quadros e atração das elites para o projeto modernizador metodista. Peri Mesquida em pronunciamento feito no Instituto Granbery por ocasião do simpósio - A volta dos Cursos Superiores - revela estes dados nas palavras do missionário Remissons:

"A Igreja Metodista , se quiser se fixar no Brasil ela não deve atuar teoricamente com a evangelização direta, mas deve atuar através da educação ... A educação deveria alcançar todos os setores da sociedade, desde a elite brasileira até as classes subalternas... A elite seria alcançada através dos colégios e através da fundação, posteriormente de universidades".

Em síntese poderíamos afirmar que, nas primeiras décadas em que os missionários metodistas atuaram no Brasil, o país se encontrava em fase de inquietante transição, o ensino em todos os graus revelava-se caótico, embora em expansão à semelhança dos demais aparelhos do Estado. Os norte-americanos gozavam de excelente simpatia perante os mandatários brasileiros e os metodistas tinham consciência dos espaços existentes e sobre eles atuaram dentro de seus limites e da ideologia de que eram portadores.

2 . Os primeiros passos de um grandioso sonho

Podemos afirmar que os missionários Metodistas norte-americanos, que vieram para o Sudeste do Brasil no fim de século XIX, e princípio do século XX trouxeram com eles, como parte da estratégia da missão, o firme propósito de instalar e desenvolver uma Universidade Metodista, preferencialmente em Juiz de Fora, poderoso centro industrial e comercial da época, localizado nas proximidades da Capital do País e dotado de excelente malha rodo-ferroviária.

Em 1894 aparece a primeira referência à vontade de ser criar no Brasil uma Universidade .

"Não pode a Igreja (americana) fazer algo este ano para assegurar pelo menos o terreno necessário à futura Universidade Metodista no Brasil".

O tema continua presente na agenda dos órgãos responsáveis, passa a receber tratamento oficial e ocupa espaços nas páginas do Expositor Cristão, órgão oficial da Igreja Metodista no Brasil . Em 1901 as referências se tornam bem mais objetivas e se faziam afirmações mais contundente .

"Os cursos superiores precisam ser implantados e desenvolvidos"

E ainda .

"A Igreja Metodista está manifestando seu interesse na causa da educação. E nosso desejo e nossa esperança que o Colégio Granbery , prospere na sua alta missão e na providência de Deus, que torna-se a primeira Universidade Metodista do Brasil".

O propósito de criar uma Universidade, em face das resistências previsíveis, tanto por parte do governo positivista, que não a desejava, neste modelo, como da Igreja Católica, que rejeitava a idéia e a impediu por todos os modos ao longo do Segundo Império , necessitava uma forte mobilização da Comunidade, providencia que o Granbery não descuidou de tomar.

"A Diretoria aprovou a idéia apresentada de uma grande reunião em Juiz de Fora e a consagração da pedra angular da futura Universidade Metodista do Brasil no dia 1º do século XX e autoriza o tesoureiro a preparar o material para tal cerimônia no caso que a conferência resolva aceitá-la."

Nesta reunião deveriam comparecer as autoridades da Igreja Metodista, também aqueles que manejavam a educação no município, além de representantes da indústria do comércio e dos poderes executivo e legislativo do município . Isto porque, além da quebra de eventuais resistências, já se desejava marcar o empreendimento com um toque das aspirações locais como confirmará a composição das futuras diretorias.

Segundo a visão do missionário, na medida em que as idéias ganhavam corpo e a Universidade se tornava uma possibilidade real, a Igreja Católica reagia e procurava neutralizar a iniciativa por todos os modos a seu alcance.

"O Bispo de Mariana trouxe para aqui 6 ou 7 padres do Verbo Divino para estabelecer um Colégio e nos combater e já começaram o mesmo trabalho nefasto aqui, que fazem em toda parte do mundo".

As resistências, entretanto, surgiram não só por parte da Igreja mas de grande parte da comunidade em função da concepção de Universidade-Igreja, que os missionários insistiam em defender em um país católico e cujos intelectuais à época se encontravam fortemente influenciadas pelo que se pensava na França, bem diferente da postura missionária dos norte-americanos.

Não obstante as pressões e dificuldades encontradas, o projeto teve seqüência normal e em 1904 é criada a Faculdade de Farmácia e Odontologia como marco inicial da concretização dos planos elaborados e sua criação provocou o surgimento de outras faculdades na mesma área, uma das quais, a da Academia de Comércio, instituição católica dirigida pela congregação do Verbo Divino, que posteriormente transferiu ao Granbery sua Faculdade de Odontologia.

3. O sonho que se tornou pesadelo

O livro de Atas da Faculdade de Odontologia, ainda arquivado no Granbery, em sua primeira página registra a reunião inaugural da Faculdade em agosto de 1904.

"As seis e meia da tarde, achando-se presentes os lentes catedráticos ... deram-se princípio aos trabalhos a ausência do Reitor, Dr.Eduardo de Menezes , tomou a cadeira da Presidência o Dr. Joaquim Monteiro."

Poucos anos após a Diretoria investe em uma Faculdade de Direito, que também é incluída no planejamento geral do Instituto Granbery por solicitação de seu reitor, atendendo a pressão da própria comunidade local.

"Peço licença para abrir uma escola livre de Direito junto ao Granbery sob condição rigorosa de poder funda-la sem maior ônus ou dificuldade financeira para o estabelecimento .

Digo aqui porém que não é minha idéia fazer coisa alguma precipitadamente ".

Nos anos que se seguem, semelhante ao que ocorria no País inteiro na área do ensino superior, as notícias de abertura de novas escolas superiores no Granbery são constantes.

"Da parte da Comissão nomeada para cuidar do estabelecimento de uma Escola de Medicina em Juiz de Fora há idéia de fazer uma proposta a esta diretoria, visando a união desta escola ao Granbery - Acho bom esta diretoria considerar o assunto...

O Presidente da Câmara de Juiz de Fora manifesta desejo do Granbery abrir uma Faculdade de Veterinária e de Agricultura, oferecendo terreno e auxílio para este fim."

Em 1911 é autorizada e concretizada a abertura da Faculdade de Direito que inicia seus trabalhos com um corpo docente de alto nível e um excelente programa baseado no que faziam as academias de São Paulo, Rio e Belo Horizonte.

"Ao terminarem seu curso, os alunos recebiam o grau de Bachareis em Ciência Jurídica e Sociais, em caso de defesa de tese, o bacharel desta Escola ou de outras Escolas, aprovados no Granbery , poderiam obter o grau de outor."

Esta explosão de cursos, ocorrida no Granbery a partir de 1904, não é fato isolado, mas se assemelha ao que se passava no ensino superior no restante do país, que cresceu no setor privado em 200% em número e escolas, 152% em número de alunos matriculados, sendo que Farmácia cresceu 167% e Politécnica 200% . As áreas em que o Granbery atuou, Farmácia e Odontologia e Direito foram aquelas que sofreram maior expansão no País inteiro .

Tudo indicava que a expansão continuaria, quando começaram a aparecer os primeiros problemas básicos ligados às questões econômico-financeiros, que passaram a determinar as relações de trabalho e de poder dentro e fora da Instituição, face mais visível de uma complexa forma de resistência local que envolvia Igreja Católica, intelectuais da terra e até poder de Estado.

A contradição era visível no relacionamento da cidade com a nascente Instituição. Juiz de Fora desejava a criação de uma Universidade e conjugava todo esforço para possuí-la mas recusava a idéia de uma Universidade-Igreja, por ser esta de confissão protestante, e com a função limitada à docência.

Por estas razões, tenho concluído que não se pode atribuir os problemas da época no Granbery à incompetência missionária e de pouco preparo dos demais participantes do processo, mas à questões estruturais em grande parte importadas do exterior e que escapavam completamente aos limites da Direção.

Consultando as atas verifica-se que a crise que se abateu sobre o ensino superior do Granbery possui algumas razões fundamentais:

- insuficiência de recursos financeiros;

- política governamental para o ensino superior;

- pressão da Igreja Católica;

- indiferença e intransigência da Junta de Missoes dos Estados Unidos;

- debilidade do mercado de alunos;

- disputa de poder no âmbito interno da instituição;

- política expansionista muito além das possibilidades reais;

- concepção de universidade pouco aceita;

- corporativismo do professorado.

O primeiro sintoma aparece na Faculdade de Farmácia e Odontologia, no relacionamento entre professores e direção em torno das questões de poder, de participação, de salários, de laboratórios e outras condições de trabalho.

Um acordo celebrado entre a Direção e os professores assegurava que os professores ficariam com 70% do salário e o Granbery com 30%, até 50 alunos matriculados. Daí para cima o rateio garantia 50% para os professores e 50% para a Direção.

O sistema de rateio entrou em colapso a partir da constatação que a Escola apresentava déficit pelo baixo número de alunos e pela necessidade de se investir em laboratórios, prometidos pela Direção e reclamados pelos professores.

"O Presidente convidou o Dr. Menezes (Reitor da Odontologia) para falar sobre a Escola. Este referiu-se à promessa feita por esta diretoria do Dr. F.Penna de que a Escola seria um bom estabelecimento. Disse precisar de laboratório para prótese, mais cadeiras, microscópios, etc."

Além das questões ligadas a deficiência de laboratórios e outros meios de trabalho, reclamavam os docentes da não participação deles nas decisões relativas à Escola e, para tentar pôr fim a esta questão, abriu-se um amplo acordo no Granbery, assim registrado e incluído nos Estatutos.

"Criação do Conselho Superior de Ensino. Será atribuição deste Conselho: organizar e coordenar todos os cursos providos nas diversas Faculdades ouvir e decidir qualquer reclamação de irregularidade praticados pelas Faculdades ou por seus membros, resolver sobre as condições de admissão de todos os cursos do estabelecimento, determinar o modo de se organizar e dirigir exames, fiscalizar os seus processos, receber relatórios das bancas examinadoras..."

Também neste mesmo ano, além da criação do Conselho, fez-se o Estatuto da Farmácia e Odontologia, que acabou por gerar protesto dos professores por não terem participado das reuniões. Os professores foram mais tarde ouvidos pelo Conselho que fez algumas concessões superficiais, que não chegaram constituir sinais de efetiva democratização.

"Resolveu convidar a Comissão presente para expor suas razões em vista de se acharem suspensas as aulas de Odontologia por motivo de uma resolução da Congregação.

A Diretoria resolveu manter as modificações feitas nos estatutos...

Deliberou-se aceitar o pedido da Congregação da Odontologia que em todas as resoluções do Conselho eles fossem ouvidos. Resolveu-se estender este privilégio a todos os departamentos".

Com a ida do Dr. Tarboux, então Presidente do Granbery,em 1912, para os Estados Unidos em férias, a situação não só continuou instável mais se agravou ainda mais, uma vez que o missionário Bruce que assumiu a Presidência não possuía a mesma habilidade de seu antecessor, e buscou medidas mais radicais - Disse ele.

"Desejo tomar medidas políticas para trazer professores norte-americanos para grande parte dos Cursos até agora ocupada por professores brasileiros".

Com este gesto e outras manifestações de força, Bruce se viu isolado dos professores, dos alunos, da própria comunidade Juiz-Forana e até de seus colegas missionários, pela maneira pouco elegante com que tratou com a junta de Missões questões salariais que teriam sido conduzidas erradamente por Tarboux, seu antecessor.

Embora seja longo o texto de Charles H.Long, creio ser de bom alvitre transcrevê-lo pela clareza com que ele trata a questão.

" A escola foi organizada nos ideais americanos em linhas brasileiras, e obteve autorização do Congresso, assinada pelo Presidente da República. Foi organizada a escola de Farmácia e Odontologia, a primeira escola de Odontologia do Brasil, e a escola de Direito começou a trabalhar para uma real Universidade. Grande sucesso coroava o esforço e o futuro parecia brilhante. Dr.Tarboux eceitava notas promissórias dos formandos e assim podiam receber seus diplomas. (...) o Rev. Bruce era um homem muito capaz e realmente piedoso mas não diplomático. Achou as notas promissórias e começou a cobrá-las, de tal forma que ofendeu a muitos patronos da escola, muitos em contato direto. Contratou um bom número de jovens americanos e ingleses. Alguns deles recebendo por meio expediente mais do que missionários recebiam por tempo integral, confiando nos recursos da escola e mesmo além deles. Queria impor na sociedade e educação brasileiras, os métodos e ideais do sistema americano sem uma adaptação devida aos diferentes costumes e cultura. (...) o Ministro da Educação e do Interior, Dr. Carlos Maximiliano de Souza, em março de 1915, depois da escola haver começado, com mero golpe de pena anulou a carta de reconhecimento concedido ao Granbery por ato do Congresso, assinada pelo Presidente".

Simultaneamente entrou em crise a Faculdade de Direito, e Tarboux, já de volta ao Granbery, assim se expressa:

"Não vejo a possibilidade de continuar a Escola de Direito. Todos os elementos com os quais contamos na hora de sua fundação nos falharam e atualmente estamos quase sem alunos e sem recursos para pagar os lentes. Ao mesmo tempo eu queria que a Congregação da Escola tomasse a iniciativa do fechamento dela."

Pelas atas consultadas se conclui que não houve empenho para se salvar a Faculdade de Direito como se fez em relação à Faculdade de Odontologia. Fica mesmo a impressão que se sacrificou aquela em função desta. Ernesto Gentil Filho, arquivista do Granbery, fez um bom resumo do fim desta Escola.

"No entanto no ano de 1915, devido a problemas internos e por perda de muitos lentes a Escola de Direito do Granbery irá se des estruturar e, alguns lentes darão continuidade a seu trabalho junto a Escola de Direito de Juiz de Fora, neste ano fundada ."

O sonho de uma Universidade Metodista ia rapidamente se desmoronando. Os ingredientes deste desmoronamento só em pequena parte se encontravam no próprio interior da Instituição e na dependência dos homens que aparentemente a dirigiam.

O sonho de uma Universidade Metodista no Granbery se tornou inviável em função das exigências descabidas do Estado com suas complicadas políticas educacionais, de insuficiência de recursos financeiros, da existência de forte espírito corporativista do professorado, da força que representava a abertura da Universidade do Rio de Janeiro em 1920, a primeira do Brasil, da indiferença e intransigência da Junta de Missões dos Estados Unidos e também da luta de poder travada no interior da Instituição , que acabou por enfraquecer Tarboux, peça importantíssima dentro do projeto, que levou a junta de Missões nos Estados Unidos a recusar sua volta com um simples e infeliz telegrama de uma frase - "Tarboux impossível".

O leitor interessado neste assunto deverá consultar pelo menos a obra Memórias de Charles A. Long, os livros de Atas da Diretoria de Granbery nº 1 e 2, outros documentos existentes no importante arquivo do Instituto Granbery, além do Annual Réport da época.

Esta primeira fase da busca de uma Universidade termina de modo pouco agradável para a Instituição com uma correspondência do Ministro Maximiliano ao Granbery.

"Tendo sido provado perante o Ministério a meu cargo que a maioria da Congregação do Instituto Granbery se desligou da minoria e fundou outra Escola de Farmácia e Odontologia, não mais é possível considerar aquele Instituto como tendo idoneidade para ser por lei especial equiparado ao oficiais. Fica pois sem efeito o aviso que reconheceu esse decreto."

Na década de 1920 observa-se um afastamento da idéia inicial e pouco se fala sobre o grande projeto. As Faculdades, de Teologia, aberta em 1920, e, de Pedagogia, criada em 1928, já possuem outros objetivos, embora tenham experimentado problemas semelhantes, exceto os de natureza financeira, uma vez que nesta década o dólar se tornou abundante em função de celebração do centenário

Os rumos e os problemas destas duas Faculdade serão motivo de outro trabalho destinado a análise do modo como a Igreja pensou e agiu em relação à formação do pessoal para o Ministério e Magistério nas décadas de 1920 - 1930. Também em outro momento trataremos de analisar os destinos que tomou o projeto da Universidade Metodista a partir da década de 1930.

4. Concepção Metodista de Universidade vivida no Granbery

Por razões históricas, o metodismo no Brasil trabalhou a idéia de Universidade como a pensavam os ingleses e os norte-americanos. Os dados nos indicam que eles desejavam a Universidade do Espírito dos ingleses, porém, por influência dos Estados Unidos, mais preocupada com a transmissão do saber útil, organizado, que pudesse ser instrumento da missão do que com a busca da "verdade", do saber puro, cujo fim estivesse em si mesmo. Um texto publicado pelo Expositor Cristão órgão oficial da Igreja Metodista no Brasil em 1911, constitui um bom resumo do que desejavam os missionários com as escolas em geral e com a Universidade.

"Qual é o fim destas escolas? Que atmosfera devem ter? A do livre pensamento da Universidade?...

Nossas escolas , pois, não terão a atmosfera de livre pensamento ,essa pertence a outros estabelecimentos. Não andamos perguntando-o que é a verdade. Julgamos saber a verdade, em parte ao menos".

Com a verdade já supostamente alcançada, a Universidade deveria ser uma ponta de lança da Igreja, missionária e atuante como ela, instrumento vigoroso de divulgação do pensamento cristão. Reflitamos no que afirmou Lander, referindo-se ao Granbery.

"No meu ideal a respeito de nosso Colégio cada vez mais "propondo para a idéia e convicção de fazer dele uma Instituição como era a Universidade de Wittenberg nas primeiras épocas da reforma. Quero dizer, um centro de influências fortes, positivos, francas e agressivas pelo Evangelho , cada vez mais arranjando nossos alunos na razão e justiça de nossa causa e mostrando-lhes pela clara luz da verdade o erro e perigo em que vivam. Um regime deste há de diminuir o número de aluno porém aumentará préstimo do Colégio para a causa que representamos."

Mas os missionários são de fato pragmáticos e conseguem expressar de maneira claríssima a tarefa que esperavam de uma Universidade Metodista. Criar competências e quadros, de modo que pudessem assumir o controle do poder do Estado.

"É nosso desejo e nossa esperança que o Colégio Granbery prospere na sua alta missão e na providência de Deus, que torne-se a primeira Universidade Metodista do Brasil. Nos anos vindouros os moços educados neste estabelecimento, ocuparão os primeiros lugares nas indústrias e profissões , no Estado, na Igreja de Cristo, noslares e na vida social do País".

Em função deste pensamento os metodistas, como já o faziam nos Estados Unidos, repudiavam a interferência do Estado nas suas Instituições, pregavam a autonomia em relação ao Estado, mas não a defendiam em relação à Igreja. A Universidade e as escolas em geral deveriam funcionar para a missão, independentes de qualquer tipo de controle externo .

"A nós nos parece, que nossa escolas, sendo estabelecidos para serem meios de propaganda da nossa fé, devem ter francamente uma atmosfera evangélica , bíblica e metodista."

5. Reflexão

Históricamente a idéia de uma Universidade Metodista no Brasil levanta algumas questões que são pertinentes e preocupantes ainda hoje, pelo menos em nosso País.

Em primeiro lugar, os dados históricos colocam a questão da autonomia na pesquisa. A afirmação do documento publicado no Expositor Cristã em 1911 é claríssima - "Não andamos perguntando o que é verdade".

Este não é um problema só Metodista mas é a própria questão ciência e fé que está posta. Jaspers afirmou que "a busca da verdade sem constrangimento de qualquer natureza é direito da humanidade", mas recentemente o Papa disse.

"Com efeito a sua presença (Universidade) é um contínuo estímulo à procura da verdade e da sabedoria que vem do Alto"

Está o papa sem dúvida a pedir da Universidade um ato de fé .

Questão problemática também é o controle do poder de participação do alunado, do professorado e das funcionários na vida da Universidade.

Este dado se encontra historicamente presente na Odontologia do Granbery e contínua sendo algo que incomoda até os nossos dias, porque inibe a Academia ao submetê-la a controles muito rígido.

Os missionários foram cautelosos em relação a este fenômeno e procuraram agir de modo muito prudente, mesmo assim se equivocaram.

A Universidade não acontece onde temos julgado que ela se encontra, isto é, no poder burocrático. A Universidade se dá, antes de em qualquer outro lugar, nos laboratórios de pesquisa e nas salas de aula.

Na Universidade não pode haver "segredo de estado". Professores, alunos e funcionários só se tornam responsáveis pelas finanças, pelo patrimônio e pela produção acadêmica na medida que se tornam efetivamente participantes.

Preservar e divulgar qualquer pensamento no interior de uma Universidade é legítimo e recomendável, mas não se consegue nem se deve fazê-lo por imposição daqueles que manejam o poder financeiro e administrativo, mas pela competência na Academia.

Finalmente o projeto metodista de Universidade, que os missionários e educadores brasileiros se empenharam em realizar, chama nossa atenção para o fato de que uma instituição de ensino em qualquer tempo e lugar funciona a reboque das políticas econômicas e de educação do Estado onde se encontra inserida.

As freqüentes oscilações por parte do Estado só podem ser assimiladas por uma Universidade particular se ela possuir um bom lastro econômico-financeiro como reserva de contingência. No caso do projeto original metodista de Universidade, todas as relações se viram truncadas e o mal-estar coletivo se tornou insuportável a partir do momento que a insuficiência de recursos comprometeu elementos essenciais do sonho como a fraternidade, a solidariedade a espiritualidade e a esperança dos participantes.

 

 

 

 

 

 

 

 

ENDERÊÇO:

Prof.Dr. Elias Boaventura

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