A ESCOLA DE EDUCAÇÃO FÍSICA DO ESPÍRITO SANTO
Dirce Maria Corrêa da Silva
Contar a História da Escola de Educação Física do Espírito Santo representa preencher lacunas na História da Educação Física espiritossantense, no período de 1931 (quando foi criado o Departamento de Educação Física e foi instalado o Curso de Emergência) a 1961 (quando a escola se transferiu para a Universidade Federal do Espírito Santo como Centro de Educação Física e Desportos).
Tal afirmativa se esclarece quando percebemos que apesar da existência de trabalhos como os de Araújo (1953), Ferrari (1957), Silva (1991) e Ferreira Neto (1993), pouco se produz ou se escreve sobre o período eleito para este trabalho.
Com o resgate desta história pretendemos detectar as influências que a Escola de Educação Física do Espírito Santo (EEF-ES) e o Departamento de Educação Física sofreram e exerceram sobre a Educação Física estadual e nacional, desde a organização dos Cursos de Emergência e Especial em 1931, passando pela criação da EEF-ES em 1934 até sua transferência para a Universidade Federal do Espírito Santo - como Centro de Educação Física e Desportos (CEFD-UFES) em 1961 (BORGO, 1981).
Apesar de tratar da história de uma instituição de ensino, mais que isto esta escola representou para o estado do Espírito Santo a consolidação da Educação Física estadual.
Desde a Reforma da Instrução Pública (Lei n° 545, de 16 de novembro de 1908) organizada pelo educador paulista Carlos Alberto Gomes Cardim, a Educação Física (ginástica) faz parte dos currículos dos ensinos primário, secundário e secundário-profissional.
Com o advento do Movimento da Escola Nova, a ginástica ganha novo impulso nas escolas da rede pública estadual com a Reforma da Instrução Pública instituída pela Lei n° 1.693, de 29 de dezembro de 1928, pelo Secretário da Instrução Attilio Vivacqua. Com o movimento revolucionário de 1930, o afastamento do Presidente do estado e do secretariado, provocaram na Educação a interrupção dos planos da reforma de Attilio Vivacqua.
O movimento revolucionário de 1930, no Espírito Santo, embora estivesse vinculado aos motivos postos a nível nacional, assumiu no estado características bastante peculiares. Em meio à disputa do poder estadual a Revolução de 1930 faz interventor o Capitão João Punaro Bley.
Durante seu governo (1930-1943), procurou melhorar os ensinos primário e secundário regularizando a situação do corpo docente; criou os centros de estudos agrícolas, fundou a Faculdade de Direito e o Departamento de Educação Física. Supomos que essas iniciativas faziam parte do programa do governo revolucionário a nível nacional.
Algumas evidências nos fazem crer que a partir do Centro Militar de Educação Física (mais tarde Escola de Educação Física do Exército), iniciou-se, nos anos 30, no país uma campanha de difusão e incentivo à prática e ao ensino da Educação Física. Participando desta campanha, o então tenente Carlos Marciano de Medeiros ao retornar ao estado, escreveu no Diário da Manhã, em 18 de agosto de 1930, a matéria intitulada "O Problema da Educação Física" onde enfatiza a importância da Educação Física e a necessidade de sua prática pela sociedade espiritossantense.
Somente com a criação do Departamento de Educação Física do Espírito Santo, em 26 de junho de 1931 (Decreto n° 1.366), segundo ARAÚJO (1953), a Educação Física obteve o impulso necessário para sua orientação metódica, científica e pedagógica.
Contando com o auxílio dos então tenentes, Carlos Marciano de Medeiros, Wolmar Carneiro da Cunha e Horácio Cândido Gonçalves e ainda o desembargador João Manoel de Carvalho, Sr. Heitor Rossi Belache, Waldemar Coelho e o Dr. Fernando Duarte Rabello, o interventor João Punaro Bley, através do Decreto n° 1.366, cria o Departamento de Educação Física.
Segundo o decreto, o Departamento tinha por finalidade difundir, regulamentar e controlar a prática de Educação Física nos estabelecimentos de ensino estaduais. No artigo 3° era previsto o funcionamento do Curso Especial de Educação Física, que deveria formar monitores e professores habilitados para ministrar aulas de Educação Física. Este curso foi regulamentado pelo Decreto n° 1.450, de 11 de julho de 1931. Antes mesmo que o Curso Especial entrasse em funcionamento, o Departamento de Educação Física organizou o Curso de Emergência que funcionou de 04 de agosto a 1° de dezembro de 1931. Supomos que o Curso de Emergência tenha tido por objetivo a preparação do Corpo Docente para o Curso Especial.
Ao final do Curso de Emergência, seguiram-se, de forma ininterrupta, os Cursos Especiais. Isto levou alguns historiadores a considerar a mesma data de criação para o Departamento e para a Escola.
Em 1931, representantes do Departamento de Educação Física participaram da IV Conferência Nacional de Educação promovida pela Associação Brasileira de Educação (ABE), cujo tema era "As Grandes Diretrizes da Educação Popular". A participação de representantes do Departamento de Educação Física permite perceber a preocupação do interventor, em consonância com o ideário da Revolução de 1930, em manter a Educação Física presente no processo de discussão da Educação Nacional.
Na VII Conferência Nacional de Educação, promovida pela ABE, em 1935, que tratava especificamente de Educação Física, o Departamento foi representado pelo Capitão Horácio Cândido Gonçalves. O capitão apresentou tese reforçando a utilização do Método Francês de Ginástica até que se criasse um método nacional. Tal tese rendeu ao Espírito Santo, segundo a matéria intitulada "O Espírito Santo e a Educação Física" (REVISTA DE EDUCAÇÃO FÍSICA DO EXÉRCITO, 1936, p.2) o título de Estado padrão (grifo do autor) para o ensino de Educação Física no meio civil.
A EEF-ES foi criada pelo Decreto n° 5.207, de 24 de agosto de 1937, sempre mantendo cursos voltados para a formação de professores. Mesmo no período em que foi denominada Escola Superior de Educação Física (ESEF-ES), entre 1936 e 1947, manteve somente cursos de normalista especializada, o que nos leva a supor que apesar da nova denominação não ocorreram cursos de licenciatura. Pelo Decreto n° 9, de 12 de agosto de 1947, a escola volta a sua antiga denominação de Escola de Educação Física do Espírito Santo (EEF-ES).
Com o propósito de "...executar um plano integrado de desenvolvimento" (BORGO, 1981, P.28) que permitisse trazer o progresso para o Espírito Santo o governo de Jones dos Santos Neves (1951-1954) trouxe da Universidade de São Paulo o professor Rafael Grisi, que reestruturou o ensino primário e encaminhou a criação da Universidade do Espírito Santo (UES).
A Universidade do Espírito Santo foi criada através da Lei n° 806, de 5 de maio de 1954. A UES foi constituída por institutos universitários e institutos complementares. A EEF-ES era um dos institutos complementares, o que nos faz supor que, apesar de parte integrante da Universidade do Espírito Santo, a EEF-ES mantinha-se econômica e administrativamente autônoma nas suas decisões, assim como os demais institutos.
Em 1961, pela Lei n° 3.868, de 31 de janeiro de 1961, a UES foi federalizada, criando a Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).
Quando, em 1966, inicia-se o processo de reforma das universidades brasileiras, a UFES foi estruturada tendo como base os Centros, passando a EEF-ES a constituir o Centro de Educação Física e Desportos da Universidade Federal do Espírito Santo.
Pelas reportagens das Revistas de Educação Física do Exército e pela imposição do Ministério da Educação e Saúde, em 30 de junho de 1931, que ordena que nos programas dos cursos de Educação Física "...sejam adotadas as normas e diretrizes do Centro Militar de Educação Física do exército (sic)..." (MARINHO, s.d.), percebemos que na maior parte do país, e também no Espírito Santo, a Educação Física surge a partir da organização da Escola de Educação Física do Exército (ex-Centro Militar de Educação Física). Isto provocou, durante o transcorrer de seus primeiros 30 anos, uma "obediência" às orientações daquela escola, que congratulou com louvores os seguidores de seus preceitos.
No entanto, apesar das preocupações em participar de eventos onde as discussões mais atualizadas da área de Educação Física eram feitas, a formação de intelectuais na área não foi um dos maiores objetivos da EEF-ES. Neste período (1931-1961) destacam-se as presenças do Capitão Carlos Marciano de Medeiros, Capitão Horácio Cândido Gonçalves, Heitor Rossi Belache e Aloyr Queiroz de Araújo.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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. Organização da educação física no âmbito estadual. Vitória, Secretaria do Estado da Educação, 1954. 50p.
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ESPÍRITO SANTO. Decreto n. 1.366, de 26 de junho de 1931. Cria o Departamento de Cultura Physica do Estado. Diário Official do Estado do Espírito Santo, Vitória, 27 jun. 1931.
. Decreto n. 1.450, de 15 de julho de 1931. Dá instrução para o funcionamento do Curso de Educação Física. Diário Oficial do Estado do Espírito Santo, Victoria, 16 jul. Instrucção, Anno 1, vol. 1, p.691-694.
. Lei n. 545, de 16 de novembro de 1908. Dá nova organisação á instrucção publica primaria e secundária do Estado. (Transcrita do Livro de Atas do Congresso Legislativo do Estado do Espírito Santo)
. Lei n. 1.693, de 29 de dezembro de 1928. Dispõe sobre a Instrucção Publica do Estado e dá outras providências. Leis votadas pelo congresso legislativo do Estado do Espírito Santo, Victoria, Oficinas do "Diário da Manhã", 1929. p.63-66.
. Lei n. 98, de 24 de setembro de 1936. Constitui a Diretoria da Educação Física e cria a Escola Superior de Educação Física.
FERREIRA NETO, Amarílio. A educação física no estado do Espírito Santo. In: I ENCONTRO NACIONAL DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO FÍSICA E DO ESPORTE, Campinas, 28 a 30 de outubro de 1993. Anais ... Campinas: Grupo de História do Esporte, Lazer e Educação Física, 1994. p.186-191
FERRARI, Orlando Antonio. A história da educação física do Espírito Santo. Palestra proferida na Reunião Semanal do Rotary Club de Vitória, Vitória, 27 set.1957.
MARINHO, Inezil Penna. História da educação física no Brasil. São Paulo: Cia do Brasil, s.d., 140p.
. A educação física no meio civil em face aos preceitos legais que a regulam. Revista de Educação Física, Rio de Janeiro, n.53, p.61-62, 1942.
MEDEIROS, Carlos Marciano de. O problema da educação física. Diário da Manhã, Victoria, p.1, 18 ago.1930.
REVISTA DE EDUCAÇÃO FÍSICA. O estado do Espírito Santo e a educação física. Rio de Janeiro: Escola de Educação Física do Exército, n.33, p.2, 1936.
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SILVA, Dirce Maria Corrêa da. A história da escola de educação física do Espírito Santo; 1930-1945. Vitória: Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Arapongas, 1991. 71p. Monografia (Pós-graduação em Educação Física Escolar) - Departamento de Educação Física, FAFICLA, 1991.
VIVACQUA, Attilio. Educação brasileira; directrizes e soluções dos problemas educacionais no Espírito Santo. Victoria: Vida Capichaba, 1930. 113p.
ESCOLA DE EDUCAÇÃO FÍSICA DO ESPÍRITO SANTO
Dirce Maria Corrêa da Silva
Universidade Federal do Espírito Santo
Resumo
O estudo da História da Escola de Educação Física do Espírito Santo, tem como objetivo detectar as influências sofridas e exercidas pela referida escola e pelo Departamento de Educação Física do Espírito Santo no período de 1930 a 1961.
Para isso pretendemos reunir informações contidas em documentos, na legislação, nos jornais e revistas, na literatura e também as obtidas através de fontes orais.
Com este estudo acreditamos estar contribuindo para ampliar as discussões acerca da História da Educação Física do Espírito Santo e do país ampliando os dados e informações até então existentes.
Referências Bibliográficas
ARAÚJO, Aloyr Queiroz de. Contribuição do estado do Espírito Santo para a educação física nacional. Palestra proferida no Estágio de Aperfeiçoamento de Professores de Educação Física. Vitória, 1953.
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